segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Mais uma vez, ela


Ele estava cansado demais para perceber o sorriso. Ela cantava alguma coisa ali deitada no peito daquele rapaz. Capaz que o cansaço o deixasse surdo. Mudo, com certeza. Avessa ao silêncio ela cantava. Ele dormia. Ele acordava. Um casal que testava a paixão vivendo sempre apertados. O dia sempre longo enaltecia a chegada de toda noite que os unia. Em casa, ele dormia. Na rua ela sonhava. Sonhava tão distraída que de supetão aconteceu de um dia não acordar.

Ele estava cansado demais para perceber a própria tristeza.
Ela sorria porque achava engraçado conseguir se sentir tão cansada.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Esperando pra ca(n)sar


E ela estava lá sentada. Com aquele enfado de quem arrumou tudo, inclusive a casa, para agradar uma visita. Olhava pela janela segurando o coração (era o dela?). Os olhos corriam aquela padeço de papel com as letras de um alguém e o poema de Vinícius. Ela sempre achou bonito alguém falar dos olhos da amada. Certa vez achou que era um insulto dizer das “muitas eras nos olhos teu”.

- Onde já se viu chamar uma mulher de velha?


Ela estava ali sentada. Com a roupa nova e até a sobrancelha penteada. Ela estava ali. A casa estava agitada. Ela estava ali. Ela não fazia nada.

domingo, 13 de janeiro de 2013

(Á)Agora?

Sai-a-fora do seu corpo (ao lado da copa) na mesa de juntar nossas alegrias espalhadas no tapete na noite anterior. Vem pro canto na cozinha ferver a melodia que nasce do seu bom dia quando o sol tenta a / cor / dar. Na janela, eu vi de perto, tem preguiça, chão sem teto e aquela cor que brilha nos seus olhos. Vem sem tanto. Só não vem sem nada.

terça-feira, 19 de junho de 2012

A moça e o sorriso


Todo dia ela saia de casa e esquecia um sorriso largado na cômoda. Seguia pela avenida partida por um canteiro (desses que falam de amor em semicolcheias com ligaduras pelos bares). Un cantautor que por una cabeza havia roto um coraçãozinho tímido. Ela seguia, seguia:

-Se guia – sua mãe sempre dizia.

Caminhando ela via passar a vontade, a vertigem, a virtude. A vicissitude. Caminhando ela chegava – essa era a palavra de ordem. E talvez por isso (e só por isso) ela caminhava. Desse jeitinho ela ia chegando onde precisava. No banco. Não no que tem dinheiro. Naquele da praça que tropeçava no pé dela sempre que ela passava. Ali ela ficava. Adormecia olhando o céu, e se lembrava. De quê mesmo? Ela nunca soube, mas se lembrava com lágrima no fosco verde do seu olhar. Fosca era a vida.

Seguia, seguia, e chegava. Trabalhava. Tentava um sorriso do canto da boca, mas nada saía. A cômoda sorria. Gargalhava com a cama. Sapateava na escada. Ou era uma salsa? Ou era um erro? As pernas faziam um laço pra presente e ela tremia. Temia, pois era hora de caminhar. E ela caminhava. Seguia. Sorria?

-Só ria! – os magos na rua diziam.

Era hora de céu alaranjado, AzulOscuroCasiNegro. Ela caminhava. Queria do brilho luar, embrulhar, presente fazer. E talvez por isso (e só por isso) ela caminhava. E sempre chegava. A casa estava lá. O portão, o sofá, o corre-dor, a cama, a cômoda. Ela olhava pro sorriso e pensava:

-Esqueci – tentando se convencer.

Então ela se lavava. Olhava no espelho e se penteava. Ajeitou o sorriso no rosto. Deitou na cama, fechou os olhos olhando para o seu céu. Sorriu. Depois dormiu.   

Daniel Aguiar

quarta-feira, 13 de junho de 2012

O homem, a lua e a flor...a(m)(d)or


hoje não quero ser seu homem
nem nome hoje eu quero ter
minha flor voou num tufão
de um vento que eu mesmo soprei

e a colorida flor chorando
caiu nas mãos de um jardineiro
moço nobre, fino trato
que repetalou a triste flor

dor de flor dura tão pouco
- a do homem é bem maior
(mas começa bem depois)

e mesmo sem a ver
o homem sente a-flor-ar
voando. E fica (um pouco)
perdido na imensidão do céu

e numa hora ou (e) outra
chorava. Via um longo negro
que nem estrela pont-ilhava

ai ele percebia
que a lua era ela passando amarela
e o sorriso blasé mostrava
a falta que a flor inda fazia

Daniel Aguiar

quarta-feira, 7 de março de 2012

Tout peut s'oublier

a ida tava feia
minha casa tava vazia
cheinha de um eco teu

que graça me fazia
cozer nossa realidade crua
ao silêncio e à luz da lua
aos berros que teus olhos gemiam

afiado seu corpo rasgava
minha pele que por fora te tocava
quando cansado seu sorriso vinha
e por dentro me cosia

eu não queria muito
só a falta do teu vazio

eu queria,
agora,
eu que ria

Daniel Aguiar

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Vontades urgentes

-Belas noites me desejo,
[sou sincero]
Mas falta tempo
Falta espaço
Sobra sol, falta mormaço

logo, em dezembro
vou abrir a janela
detalhar o cansaço
[Soltando as mãos]
largando ais
deitar no ar
e nada (há) mais

Daniel Aguiar.

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